quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Espetáculo

Convidaram-me para ser ator.
Ator de uma peça da qual eu não queria participar.
O fato é que nunca consegui me acostumar com o público.
Aplausos, silêncio, aplausos, silêncio.
Tal alternância me parecia incoerente, e eu sempre pensava o quão incoerente era cada movimento meu, sobre aquele palco pouco iluminado.
Diziam-me que, enquanto ator, deveria fazer com que as pessoas expressassem sua essencialidade, sentissem-se vivas, humanas.
Diziam-me que eu deveria fazer com que as pessoas rissem, chorassem, ou demonstrassem quaisquer sentimentos, por mais artificiais e ligeiros que fossem.
Quer saber?
Isso é responsabilidade demais pra mim.
Eu, um mero ator.
Por quais motivos eles me atribuem tal tarefa? O que os fazem pensar que sou capaz de roubar sorrisos, lágrimas, gestos?
Sentimentos ligeiros e artificiais.
Em que se consiste a ligeireza do seu sorriso? Seriam os segundos entre os quais você movimenta sua boca?
Em que se consiste a ligeireza da sua lágrima? Seria a velocidade com que ela rasga seu rosto?
São ligeiros movimentos, certamente. Mas seriam eles artificiais? Talvez possam ser.
Mas quem sou eu para julgar?
Eu, um mero ator.
Quando pretendia extrair risos, arrancava lágrimas. Quando lágrimas pretendia enxergar, via risos brilhantes estampados naquela platéia escura.
Aplausos, silêncio, aplausos, silêncio.
Silêncio, aplausos, silêncio, aplausos.
Tudo muito rápido, artificial.
Mas o que sou eu senão a artificialidade em pessoa? A artificialidade no palco, na Terra, na vida?
Ora, sou um ator.
Ator de uma peça da qual não queria participar.
E agora, tento encaixar peças, para montar a grande farsa que é este espetáculo.

Sou a cura do mundo, à procura de minha própria cura.


11 comentários:

  1. Eu tb me considero uma atriz de um espetaculo que nao me perguntaram se eu queria participar.

    Fui colocada aqui e estou desempenhando meu papel. Até qdo eu não sei!!

    Abs

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  2. sim, no final de tudo somos apenas erráticos e despreparados atores neste espetaculo complicado que é a vida!

    tem um selo pra você no meu blog!
    passa la depois!

    beijos

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  3. amooo teatro!!!!!!
    é tudo de bom, quem sabe um dia....

    passa no meu blog e comenta também!
    abraço!

    http://atraiumeuolhar.blogspot.com

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  4. A gente não é "convidado" a participar dessa peça, né? .. A coisa é meio compulsória! :)

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  5. A vida é repleta de incoerências, essa
    é a realidade.

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  6. Complexo. Estar ali pra arrancar risos, lagrimas e outros sentimentos. Na verdade, as pessaos precisam disso, nós precisamos, e alguém precisar cumprir esse papel!!! rs

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  7. woooow.. uma ótima combinação de palavras e melhor ainda a sequencia!
    gosto de textos assim, com uma leve crítica a algo, muiiito bom man..abraços

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  8. Olha, como ator eu não sei se você daria certo, mas que você consegue fazer arte com as palavras isso é fato!

    Que etxto legal de se ler! Parabéns!

    http://papeisriscados.blogspot.com/

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  9. Pensamento a la Jean-Paul Sartre. Belo texto, Rapha!

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